28 fevereiro 2012

uma Barca e dois Corvos

18h52, já sei que ainda assim no meu relógio, o meu relógio está sempre adiantado, a tentar compensar eu estar sempre atrasada, nem sempre funciona, mas está adiantado, neste caso acho que são 9 minutos, não tenho bem a certeza mas acho que são 9, nem 5 nem 10, como dizia a outra, nem 27 nem 19, acrescento eu, são 9, mas para aqui não importa, eram 18h52, bem sei que no meu relógio, mas pronto, 18h52 e não se fala mais nisso.

18h52, e sabias que as luzes da cidade se acendem todas ao mesmo tempo? Já vivo aqui há tantos anos, 22, 21 se contares o ano fora, e já agora desconta também os outros em que vivi mas não tinha consciência do que era uma cidade, ou uma luz sequer, que pronto, uma pessoa é precoce mas não dá para tudo. Eram 18h52 e eu pestanejei, pestanejo imensas vezes, "acontece-me imensas vezes", mas desta vez foi diferente, olhei para a ponte, pestanejei, voltei a olhar para a ponte e estava tudo diferente, montes de luzinhas, pontinhos de luz sobre a ponte, tipo um daqueles frisos que fazíamos nos cadernos do 4º ano. E olho em volta e o arco da Rua Augusta (que eu nunca percebi porque é que não é avenida, a minha rua é muito mais pequena e é avenida) o arco da Rua Augusta, dizia, está agora iluminado contra o roxo deste lado do céu, e giro mais o pescoço e o Castelo também brilha, e agora que reparo nisso o amarelo dos antigos ministérios está ainda mais amarelo, e apercebo-me de que o Cristo Rei é agora uma torre de luz contra o cor-de-rosa do céu, e o céu é o único sítio onde o cor-de-rosa não é foleiro.

Levanto-me para me ir embora, tentar ir embora, é mais isso, não consigo ir sem lançar um último olhar às colunas, a imponência, senhores, a grandeza, e não sei porquê, isto é tão estúpido, "se é o que sente não é estúpido", os psicólogos estão tão bem ensinados, não sei porquê passo por elas e dá-me a sensação que me devia benzer, que estupidez, eu que faço questão de não me benzer nem numa igreja, por respeito ao que sei que significa para quem coiso, mas desta vez vai-se a ver e deu-me para isto, se calhar é por serem as portas de tudo, se calhar é por já sentir ao longe o ar do mar (e agora ia escrever 'mar' e juro que me saiu 'amor', isto ele há coisas) mas olho para as colunas e sinto que devo baixar a cabeça em sinal de respeito, pelo menos isso, qualquer coisa, não sei, surge a urgência de homenagear o que para mim é o tal de sagrado, porque só o sagrado é que faz isto às pessoas, não é?

Já fui tantas coisas aqui, isto faz-me lembrar a primeira vez que entrei na Basílica de São Pedro, desatei num pranto e não conseguia parar, aquilo era tudo demasiado grandioso para me caber, então chorava, chorava, chorava, a ver se abria espaço cá dentro para caber tanta beleza, chorei durante séculos, nunca mais saía dali, mas tem graça, acho que nunca coube. E agora percebo que é sempre assim, venho aqui desde sempre e é sempre assim, esta urgência de homenagear, esta sensação de que é o mínimo que posso fazer, um aceno de cabeça, uma bênção interior, um "obrigadinha por tudo", e acabo por me aperceber, a sorrir, de que foi assim, foi por isto mesmo que decidi que o mínimo que podia fazer, ou então o máximo, ainda estou para perceber, era uma barca e dois corvos, na nuca, tudo bem, ou noutro sítio qualquer.

E é sempre esta sensação neste sítio, esta urgência de homenagem e a urgência de escrever mais rápido do que aquilo que as mãos acompanham, sempre o rabo já dorido de estar sentado há demasiado tempo na pedra dura, sempre as mãos demasiado geladas para manterem uma caligrafia perceptível, sempre o frio a entrar pelas frinchas do casaco (os casacos também têm frinchas, ou são só as janelas?), sempre as lágrimas nos olhos, do vento frio e do overwhelming, continuo sem tradução para esta palavra, talvez lhe possa chamar Lisboa que é mais rápido. E sempre You Can't Win, Charlie Brown a baterem-me palminhas aos ouvidos, e o cérebro num misto entre papa emocional e a calma que só se tem quando se sabe que se vive na cidade mais perfeita que existe, e o cérebro a debitar coisas que as mãos já não conseguem escrever, e não faz mal, vamos andando, último sorriso em direcção ao rio, piscar de olho em direcção ao Castelo, que amanhã por esta hora as luzes da cidade acendem todas ao mesmo tempo outra vez.

Óscares, ou outra noite qualquer

Sabes que tens os melhores amigos do mundo quando eles:

. entram pela tua casa adentro com comida debaixo do braço, começam a cozinhar sem pedir licença, e fazem jantar a mais a contar com o teu almoço do dia seguinte;
. assumem que vão dormir em tua casa, sem sequer perguntar;
. te trazem uma mala cheia de chocolates, batatas fritas, cachorros quentes e pipocas porque sabem que é esse o ritual;
. não te acordam quando saem de manhã porque sabem que só tens aulas à noite;
. ocupam o teu sofá sem qualquer tipo de cerimónia;
. não te deixam dormir a queixar-se que comeram demais.


E sabes que gostas mesmo mesmo deles, quando:

. a tua preocupação quando eles adormecem no sofá é tapar-lhes os pés com uma mantinha;
. percebes que só faz sentido ver os Óscares em directo há 10 anos porque é com eles.

26 fevereiro 2012

Juro que isto acabou de me acontecer.

Estava eu sozinha em casa, refastelada no sofá, a ver um qualquer programa culturalmente interessante (*cof*TLC*cof*) quando toca o telefone de casa.


Levanto o rabo do sofá e vou até ao telefone, resmungando entredentes a pensar quem raio é que me estaria a ligar para casa àquelas horas.

"217... Espera lá... Eu conheço este número. Este... Este é o MEU número."

Pausa.

"Este é o meu número DE CASA."











THE CALL IS COMING FROM INSIDE THE HOUSE.































Mas não, era só a minha mãe a estrear a nova aplicação que lhe permite usar o número de casa a partir do iPhone .

23 fevereiro 2012

*#%$&/=?

Estou há 7 horas com um torcicolo tão grande, que estou a considerar seriamente a hipótese de não ir às aulas hoje, não só pela dor que me faz grunhir de raiva por não me conseguir mexer, mas pelo perigo que neste momento represento se estiver ao volante de um carro.

É muito ridículo aparecer na faculdade com uma daquelas almofadas de caroços de cereja que se aquecem no microondas enrolada à volta do pescoço? É que é capaz de não fazer pandã com o material de laboratório.

19 fevereiro 2012

Também gosto muito de ti, mãe.

Mãe: "Ah e tal, quando fomos ao sítio tal, lalala..."
Eu: "Sim, isso foi em 2009."
Mãe: "Mas como é que tu sabes sempre as datas assim de repente?!?"
Eu: "Sei lá, mãe, lembro-me."
Mãe: "Ai... Tu és esquisita!"

17 fevereiro 2012

Chapulines

Dado que faz hoje um ano que cheguei ao México, faz sentido que tenha sido hoje o dia em que provei um gafanhoto frito pela primeira vez. Estou do lado errado do mundo, mas ainda assim.

Este post vai ser extremamente mediano para qualquer biólogo que ande por aí.

Ou mesmo para qualquer pessoa que tenha estado em Ciências no Secundário, na realidade. No entanto, como eu sou uma pobre criatura de Humanidades, a minha vida atingiu um novo nível hoje. Porque o segundo semestre do 1º ano do meu mestrado acabou de se tornar mesmo, mesmo interessante.

Tivemos hoje a primeira aula de Técnicas Laboratoriais em Psicobiologia, e apesar de algumas pessoas serem da opinião de que "as primeiras aulas de laboratório são sempre uma seca", eu nunca tinha estado mais do que 5 minutos num laboratório, portanto estava em modo criancinha-na-véspera-de-Natal.

Explicaram-me a parte teórica, passaram-me uma pipeta para as mãos, deixaram-me ligeiramente nervosa com as regras de segurança, e deixaram-me brincar um bocado. Mas mais do que isso deixaram-me consciente da responsabilidade que vamos ter ao longo das próximas semanas, dado que vamos estudar a actividade cerebral em peixes que NÓS vamos manipular.

Mas a primeira aula é sempre teórica, não é? Até ao momento em que dou por mim em frente a um aquário com um único peixe, a ver 2 gramas de anestésico serem despejadas lá para dentro. E depois, não sei como, dou por mim em frente a um microscópio, luvas calçadas, bisturi numa mão, pinça na outra, peixinho (já morto) no tabuleiro por baixo do microscópio, com a prof ao meu lado a dizer "vá, agora fazes uma incisão aqui, cortas o músculo com um golpe profundo e removes os pedaços de crânio, com cuidado para não danificar o cérebro". Ou qualquer coisa desse género, porque a única coisa que conseguia ouvir era o meu coração a bater-me nos ouvidos. Está bem que o peixinho já está morto, mas basta um movimento em falso e esta investigação vai toda com o camandro, para não falar da péssima impressão com que me ia carimbar imediatamente.

Ignorando a rápida imagem mental do meu pai a arranjar o peixe para o jantar, lá uso o bisturi para (tentar) expor o cérebro. Prof: "Isto tem de ser rápido, quanto mais tempo demorarmos mais rapidamente o cérebro se começa a desfazer". Não, na boa, sem pressão. Do nada deixo de sentir a mão esquerda, e de repente oiço um estrondo metálico. Olho para baixo e vejo a pinça no tabuleiro. A prof rosna: "Temos de ter muito cuidado com o material, basta isto cair verticalmente e acabou-se." Bacano. Enquanto começo a pensar se não teria sido melhor fazer um mestrado em corte-e-costura, lá pego na pinça outra vez, encosto os olhos à lupa do microscópio e tento coordenar os movimentos, sem olhar directamente para as mãos ou para o tabuleiro. O que parece meio metro de distância à lupa é para aí meio milímetro na realidade, mas dado que temos de ver tudo através do microscópio não podemos olhar directamente para o que estamos a fazer, o que torna a coordenação motora -matéria na qual já normalmente sou grande profissional, diga-se de passagem- um desafio interessante.

Prof: "Pronto, o cérebro assim já está exposto, agora usa a pinça para puxar o telencéfalo, e corta-o na base com o bisturi." Olho através da lupa. Gosma cinzenta all over. É suposto eu saber distinguir qual destas pseudo-bolinhas é que é o telencéfalo? Pensamento: "Isto com as corzinhas e as legendas dos slides era bem mais fácil...". Respiro fundo. Tento agarrar a pseudo-bolinha que teoricamente correspondia ao telencéfalo com a pinça. A bolinha escorrega. Tento agarrá-la outra vez. A p*** escorrega outra vez. Juro que consigo ouvir a sua vozinha a rir-se para mim enquanto mostra os dentes todos e diz "problem?". Agarro-a com todas as forças que o indicador e o polegar oponível me permitem, com a certeza absoluta que aquela merda vai explodir e espirrar matéria cinzenta por todo o lado. Ela aguenta. Uso o bisturi para a separar do resto do cérebro. Ela aguenta-se. YEY! Abro um dos tubos previamente identificados para o efeito, atiro a bolinha para dentro da solução, fecho o tubo, enfio-o numa taça cheia de gelo e levanto-me da cadeira a cantar interiormente a 'We Are The Champions'.

Eu sei, eu sei, sou uma criança e isto não é nada. Mas foi a minha primeira aula em laboratório. Nunca tinha sequer visto um cérebro animal, quanto mais manuseá-lo com material "cirúrgico" e microscópios xpto e compostos com nome esquisito. Deixem-me lá sentir-me um bocado Derek Shepherd, vá, só desta vez.

12 fevereiro 2012

The Iron Lady

Não vou aqui discutir o filme, não vou aproveitar este post para recomendar os cinemas do Campo Pequeno, nem sequer vou entrar pelo tema do stand de gomas que existe ao lado das bilheteiras... (hmmm, gomas!)

No entanto adorava que me explicassem, isso sim, que raio de moda é essa agora de baterem palmas no cinema no final de um filme. Acharam que os actores foram fascinantes e por isso mereciam o miminho, pensavam que se estava a passar tudo em directo tipo reality-show-TVI, ou simplesmente confundiram-se ao entrar na sala e pensavam que estavam a testemunhar uma aterragem no aeroporto do Funchal?

10 fevereiro 2012

o-que-é-que-você-me-foi-fazer-ao-cabelo-mulher

Sempre ouvi dizer (na realidade disseram-me na semana passada, mas ainda assim) que há 3 pessoas com quem uma mulher nunca deveria ser vaga naquilo que diz: com a sua melhor amiga, com o seu ginecologista e com a sua cabeleireira.

Claramente devia ter prestado mais atenção à terceira parte. Aparentemente não é assim tão óbvio que o meu objectivo para 2012 não era parecer um cogumelo com braços e pernas.

04 fevereiro 2012

Que deus tenha piedade da minha alma

Tenho a casa toda a cheirar a pipocas queimadas. Tenho de abrir as janelas... Vai ter que ser.

Estão 4ºC lá fora, e ainda só são 20h10.

Abrir as janelas todas, enrolar-me numa manta e rezar pelo melhor? Ou ignorar o cheiro e esperar pelos primeiros raios de sol de amanhã para proceder à situação?

A vida é feita de escolhas difíceis.

02 fevereiro 2012

Estou a exactamente a 24 horas da liberdade.

Vão ser 9 dias de férias, a começar amanhã exactamente às 22h30.

Mas para lá chegar terei de passar primeiro pelas (aprox.) 22 horas de trabalho árduo e estudo intenso que se impõem entre nós. Qual príncipe encantado num cavalo branco a atravessar o bosque mágico e a matar o dragão para resgatar a princesa. Só que em mais fixe, porque a princesa neste caso são as férias. E eu sou o príncipe encantado...?! Ok, se calhar preciso de melhorar as minhas metáforas. Mas pronto, posso fazer isso nas férias.

Portanto vá, pessoal, tudo a fazer um forcing nos pensamentos positivos na direcção do Campo Pequeno antes do xixi-cama de hoje à noite!